Contexto do julgamento
Em 22 de abril de 2025, o Supremo Tribunal Federal (STF) publicou o acórdão do ARE 1.519.617/SP, o qual validou a decisão da 1ª Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) que reconheceu o direito ao creditamento de ICMS na aquisição de insumos essenciais ao processo produtivo, ainda que seu consumo ocorra de forma gradual e não haja incorporação ao produto final.
Caso concreto
No caso concreto, a controvérsia envolvia uma empresa do setor sucroalcooleiro que buscava se creditar de ICMS relativo à compra de equipamentos utilizados no corte de cana-de-açúcar, como facas, fios agrícolas, martelos e bagaceiras. O Fisco paulista defendia que tais itens não seriam passíveis de creditamento em razão de não integrarem fisicamente o produto final.
Entendimento do STJ
O STJ, ao analisar o caso por meio de Embargos de Divergência, afastou o entendimento da Fazenda Estadual, destacando que, de acordo com a Lei Complementar nº 87/1996 (Lei Kandir), o fator determinante para a apropriação de créditos de ICMS é a essencialidade do insumo para as atividades-fim da empresa, e não sua incorporação física ao produto.
Segundo voto da Ministra Regina Helena Costa, são passíveis de crédito os itens cuja ausência comprometeria a produção, afetando sua qualidade, quantidade ou viabilidade, caracterizando-se como estruturalmente indispensáveis ao processo produtivo.
Entendimento do STF
Ao ser provocado por Recurso Extraordinário da Fazenda Estadual, o STF não conheceu do pedido, por considerar que a controvérsia não tratava de questão constitucional, mas sim infraconstitucional, e que o recurso exigiria reexame de fatos e provas – o que é vedado na instância extraordinária, conforme estabelece a Súmula 279 da Corte.
O relator, Ministro Edson Fachin, também afastou a possibilidade de sobrestamento do processo até o julgamento do RE 1.424.015/SC, por entender que não há elementos que justifiquem o reconhecimento de repercussão geral sobre a matéria, reforçando o entendimento de que cabe ao STJ definir os limites da não cumulatividade do ICMS com base na legislação complementar.
Esse posicionamento está em consonância com o que já havia sido decidido no Tema 346 da Repercussão Geral (RE 601.967/RS), no qual o STF afirmou que a Constituição garante o princípio da não cumulatividade, mas delega à lei complementar a regulamentação da compensação de créditos de ICMS.
A tendência atual do STF é de manter o entendimento consolidado no STJ acerca da interpretação da não cumulatividade do ICMS, evitando intervir em matérias já pacificadas à luz da legislação infraconstitucional. No entanto, as Fazendas Estaduais continuam empenhadas em reverter esse cenário, tentando levar o tema ao STF por meio da repercussão geral, o que pode gerar novos contornos ao debate no futuro.
Impactos práticos para sua empresa
Embora a Lei Complementar nº 87/1996 já reconheça expressamente o direito ao aproveitamento de créditos de ICMS sobre insumos intermediários, ainda persiste, por parte de diversos fiscos estaduais, a restrição à sua efetiva utilização. Na prática, é comum que esses insumos sejam enquadrados como bens de uso e consumo, cuja apropriação de créditos estaria autorizada apenas a partir de 2033.
Nesse contexto, a recente manifestação do STF representa uma oportunidade estratégica para que as empresas revisitem seus processos internos e reavaliem a estrutura de suas cadeias produtivas. O objetivo é identificar créditos de ICMS passíveis de recuperação nos últimos cinco anos, desde que os insumos estejam diretamente vinculados à atividade econômica preponderante da pessoa jurídica.
Adicionalmente, com a aproximação do período de transição para o novo sistema de tributação sobre o consumo — que prevê a implementação da Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) e do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), nos termos da Reforma Tributária —, ganha ainda mais relevância a correta apuração e o aproveitamento tempestivo dos créditos acumulados sob a sistemática atual.
Esse alinhamento prévio poderá impactar de forma significativa os saldos de transição e os mecanismos de compensação que serão aplicados nos próximos anos. A inércia nesse momento pode resultar na perda de créditos legítimos e financeiramente relevantes.
Recomendações
Sendo assim, orienta-se que as empresas que utilizam materiais intermediários essenciais em seus processos produtivos: (i) realizem uma análise detalhada dos itens utilizados para verificar o enquadramento no critério de essencialidade e (ii) mantenham comprovação documental da vinculação desses insumos à atividade-fim.
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O time tributário do RMDC Advogados está à disposição para auxiliar sua empresa na análise e na implementação de estratégias que assegurem o aproveitamento adequado de créditos de ICMS relacionados à aquisição de produtos intermediários, levando sempre em conta as especificidades das operações e da atividade empresarial envolvida.